COMÉDIA DO PATRIARCADO PRIVADO lV (Não tenho certeza)
O Nascimento da Sogra
Nana é uma eremita. Bonita, bem tratada, relativamente bem sucedida.
Patrícia é atualmente a sua única amiga, a única no seu zap, a única a frequentar
a sua casa. O destino deu uma força, pra Nana tê-la como amiga.
Seus celulares eram o mesmo, nesse dia ela estava sentada no bar da
Patrícia, ela ligou o Blue Tooph, e o programa captou o dela.
Patrícia, comunicativa e até um certo ponto, meio que sem noção e
intrometida, foi cavando a amizade com Nana.
Nesse dia, Patrícia fala que reencontrou sua ex-diretora de colégio.
_Quando soube que ela nunca se casou, me deu uma pena! Ela sempre foi
tão bonita!
_Me poupe da sua pena, Patricia. Por favor.
Nana é o tipo de mulher catalogado pejorativamente como "solteirona"
ou "encalhada".
_Não é isso que quero dizer. A diretora Marluce sempre foi bonita,
elegante. Não merecia destino tão triste.
_Então, por eu ser feia, mereço destino tão cruel, como a minha atual
condição?
_Não, você ainda tem tempo de arrumar um marido!
_Ela parecia triste, quando a reviu?
_Não, pelo contrário. Não aparentava ter 60 anos, você dava a ela uns
quarenta e poucos anos. Sorria, conversava com voz forte, se lembrou de mim
como aluna, da minha avó...
_Qual foi o problema, então?
_Ela ter ficado sozinha. Perguntei se havia casado, ela disse que não.
_Por que fazes sempre essa pergunta? Isso é de cada um. Ninguém tem
obrigação de casar, e tem aqueles que não gostam de responder.
_Não complica, Nana. Sempre torci por ela, para ter um final feliz.
_Mas ela não está feliz? A viu por minutos, e já a julga por ser
solteira?
_Não estou julgando. Afinal, ninguém é feliz sozinho. Acredito que ela
escolheu demais. Por isso ficou encalhada.
Nana detesta esses termos...
_Patricia, ela não "escolheu demais" Ela apenas não quis se casar
com qualquer bosta, apenas pra dizer que tem macho em casa.
Quase sempre um cara gordo, barrigudo, incapaz de se levantar no sofá,
pra pegar a própria cerveja, que de vez em quando a trai.
Enquanto Patricia discute sobre solteirice alheia, Nana se lembra da sua
família, de quem há muitos anos se distanciou. Sua saúde mental melhorou muito
depois disso tudo.
Era uma família numerosa. Em casa eram seus pais, um tio, sua avó e mais
6 irmãos.
Ela era filha única...
Nunca entendi, como a razão de pessoas me aconselharem a casar, mesmo
vivendo a merda que viviam, mesmo sabendo da encrenca em que se meteram ao juntar-se
com alguém.
Homens infiéis que me aconselhavam a casar, pois seria bom um homem na
minha vida.
Mulheres que reclamavam da vida, gordas, descabeladas, me aconselhando a
casar, apesar do exemplo.
Viver em família é um eterno conflito.
Sua mãe tinha o péssimo hábito de conversar coisas de adulto na sua
frente.
Um papo recorrente era sobre sua sogra.
Tudo que sua avó fazia ou dizia, sua mãe acreditava que era pra
confrontá-la ou por rancor.
Mas à medida que seus irmãos cresciam e chegavam a puberdade, sua mãe,
uma grande vítima de uma sogra chata, cruel e ciumenta do filho, ia se tornando
no mesmo monstro que sua sogra era.
Sua mãe nunca foi de sair, ficar no portão, visitar vizinha pra bater um
papo.
Seus filhos homens sempre gozaram de grande liberdade.
Viviam na rua, à medida que avançava a idade, voltavam cada vez mais
tarde.
Isso nunca abalou seus pais. Pelo contrário, suas saídas diárias, eram
bancadas com gordas mesadas, carros e motos.
Nesse dia, o mais velho se preparava para ir à rua.
Por uma razão estranha e desconhecida, Eunice resolveu acompanhar o
filho, e levar Nana junto.
Foi o primeiro embate.
Julião ao saber que a mãe queria acompanhá-lo, deu as costas e entrou
pra dentro de casa, muito puto, pisando forte no chão.
Eunice, sem entender nada, foi atrás do filho.
Conversou com ele, e partiram.
A cara do Julião estava amarradíssima.
Chegando na esquina, Julião encontrou a sua turma e ficou por lá. Eunice
foi adiante e foi direto no bar do Seu Careca e da D. Laudicéia. O casal era
amigo da minha mãe.
Ela sentou na calçada e começou a conversar com a menina que estava
trabalhando no bar deles.
Aquilo era inédito para Nana.
A mãe sair, ainda levá-la pra rua, e conversar com algum vizinho.
Recusava convites de almoço, casamento...
Os dois pareciam ter raízes dentro de casa.
Nana, estava em êxtase. Logo se enturmou com uma turma de meninas que
brincavam de pique.
Eunice pede a filha pra chamar seu irmão:
_Pergunta a ela, porque que ela não vem aqui!
Voltando:
_Ele falou pra você ir lá.
_Fala pra ele que é só um minutinho.
_Ela falou que é rapidinho.
_Não falo com vagabundas que sentam em bar!
_Ele disse que bar é coisa de vagabunda, e não vai aí.
Nana apenas passava os recados e voltava para a brincadeira.
Seu irmão tinha uns 14 anos.
Chegou a hora de ela partir. Sua mãe voltaria sozinha pra casa. Nana,
indiferente a tudo, voltava feliz e perguntou se amanhã poderia brincar com
suas novas colegas, ela respondeu com um seco “não.”
Foi dormir.
Os irmãos homens, livres, voltavam bem tarde da rua, nunca menos das 11
da noite.
Por volta da meia noite, foi acordada com os gritos da sua mãe.
Nunca viu Eunice gritar tão forte, tão alto, o resto da família em
volta, e Julião deitado na cama escondendo a cabeça.
Ela chegou a achar que sua mãe teria um ataque, pois uma espuma branca
vazava dos cantos da boca.
Eunice disse que não sabia de nada.
Que jamais imaginou que a menina que trabalhava no seu Careca, era
namorada do Julião.
Que não havia razão pra ela ser atacada e ofendida pelo próprio filho.
Hoje Nana pensa diferente.
Como foi dito antes, Sua mãe não saía pra nada, por ninguém, para à rua.
Ao sair, fez questão de acompanhar o Julião.
Chegando ao destino, foi direto no seu Careca, conversar com a menina
que estava trabalhando no bar.
Na certa...
Um passarinho buzinou no ouvido de Eunice, e ela foi conhecer a
candidata a nora.
Julião detestou.
Com as namoradas seguintes, ela fez pior.
Descrevia as namoradas do filho como piranhas, de quem seu filho homem
sarrava, tirava proveito. Quando Julião anunciou o término com uma delas, ela
abriu champanhe para comemorar.
Como seria essa nora, ao se tornar uma sogra?
A pior de todas.
Ela pouco a pouco estava se tornando no monstro intransigente que era a
mãe de seu marido.
Por que sogras e noras sempre se detestam?
Eu já vi sogras e genros se darem bem. Mas nunca vi noras e sogras terem
alguma relação de carinho.
Complexo de Elektra?
Nana retorna ao presente:
_E eu não sou machista!!
Era a frase da Patrícia, concluindo o seu raciocínio.
_Patricia, você se dá bem com a sua sogra?
_Claro que não!
_Seu filho tá começando a namorar, não é mesmo? O que acha das
namoradinhas dele?
_Tudo pirainha!
Nana sorrir, prendendo as gargalhadas.
Quando a gente casa, levamos um pacote junto. Pacote que para as
mulheres, é bem mais pesado, e chato de carregar.
Mas quando se tornam matriarcas, não fazem muito esforço para quebrar o
ciclo.
Todas viram sogras chatas que jamais aceitarão as noras que seus filhos
escolheram.
Há quem diga que isso é coisas do patriarcado. Nana acha que é de mulher
mesmo.
Todas nascidas para se detestarem...
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