PAULINA



Sempre me pergunto se famílias perfeitas existem somente em comerciais de margarina. Conheci muitas, dezenas de famílias problemáticas, a da Paulina era uma dessas.
Ela era mais velha do que eu, da idade dos meus irmãos mais velhos. Conhecia de vista, porque de vez em quando, ela frequentava a minha casa como amiga dos meus irmãos.
Uma vez fui comprar refrigerante para o jantar, em frente a avenida do seu Manel estava Paulina toda machucada, com respiração ofegante, havia cortes no seu corpo que sangravam. Perguntei o que havia acontecido ela respondeu:
_Minha mãe me bateu.
A cena assustadora para um adulto, imagine para uma criança, comentei com minha mãe, que imediatamente a acolheu.
Ela dormiu em casa.
Na manhã seguinte, comprando pão, dei de cara com Adelmo, procurando pela irmã, e disse que ela estava em casa.

Minha mãe contratou Paulina como empregada da casa, ela teve a sua primeira e única festa de aniversário patrocinada pela D. Aparecida.
Namorou a Almir.
Sim, Almir, antes de se descobrir gay ou se tornar um, namorou mulheres. Ela era apaixonada por ele. Disse que viveu um conto de fadas. Ela a gorda e feia da turma, namorando o rapaz mais bonito e mais rico da rua.
Ela não ficou muito tempo em casa.
Esse era o paradoxo da Paulina. Comia o pão que o diabo amassou em sua casa, sofria, um cachorro tinha melhor tratamento que ela, quando surgia a chance de ela sair desse inferno que era viver com sua mãe e seus irmãos, ela não ficava muito tempo fora. Sempre voltava para sua masmorra.
Piorando a sua situação, ela ainda teve uma filha, solteira e desempregada. Prato cheio para ser ainda mais maltratada pela sua mãe e seus irmãos. A criança morreu ainda bebê.
Conheceu um cara mais velho, um tal de Honório. A diferença era a clássica de 20 anos. Foi morar com ele na Região dos Lagos. Um caminho para Paulina?
Em relações assim sabemos o constrangimento da família, onde a nova madrasta é poucos anos, quando não mais nova que os filhos do cara. Além de não ter a “aprovação” dos enteados, a família que a engoliu meio que forçado a sua presença. E claro a eterna impotência que atinge homens maduros.
Ela foi logo cantar o cunhado!
O mesmo reuniu toda a família e contou o que aconteceu na frente dela e de todos os familiares.
Foi devolvida à sua masmorra no dia seguinte.
Como todo ex-marido, ele não era de dar pensão ou de visitar o filho. Às vezes aparecia, dava uma esmola, fazia uma promessa, como de alugar um quartinho para ela morar fora de casa, e desaparecia.


Foi nessa época que eles foram morar na avenida.
Meu irmão a acolheu. Pois a família ainda era numerosa, e sempre que um dos irmãos chegava cedo do trabalho, ela tinha que levantar para ele dormir. Ela passou a dormir no quarto do Almir.
E como de costume, fazendo caridade com dinheiro dos outros, Almir sempre comprava um saco de leite a mais no café da manhã, para dar para ela. Até ele perdeu a paciência com ela, pois Paulina pegava o saco com tanta desfeita, que ele parou com isso.
Presenciei brigas feias e diárias entre ela e sua mãe.
Em uma delas, tive que intervir...
Ela se aborreceu com a mãe e começou a espancar o filho. Fui falar com Liene, a mãe de Paulina, que mesmo chateada, tomou o neto da mão da filha.
Presenciei outras bizarrices, já contadas neste blog. Neste tempo, morava um cara metido a garanhão, o Aluizo.
O cara em uma semana, transou com a Liene, a mãe de Paulina, no dia seguinte, com Paulina, e no final de semana saiu com a Marta, tia de Paulina e irmã de Liene.


Entregar o filho para morar com o pai, talvez fosse uma solução lógica. Paulina sempre fazia isso, mas depois, chorava de saudades do filho, pedia empréstimos que nunca pagaria a amigos para buscar a criança, e depois quando estava insuportável a convivência com a mãe ela devolvia o garoto para o ex.
Foi nessas idas e vindas entre Belford Roxo e a Região dos Lagos que ela morreu num acidente de carro. A criança sobreviveu.
Acabou ficando aos cuidados de Liene e os tios.

A vida da Paulina foi triste. Sofrida. Sua mãe a impediu de estudar para cuidar dos irmãos mais novos, não gostava dela, e nas poucas oportunidades que teve de ao menos sair da submissão familiar, ela não aproveitou ou voltou atrás.

Se reencarnação existe, mais sorte da próxima vez...



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