HERANÇA
HERANÇA
O sol partia
Ao chão caia
E minha vida revia
O sofrimento do parto
O frio
O grito
A primeira surra
Porque de noite não dormia
De dor e fome, sofria
Sinto meu corpo crescer
O chão, meus pés conhecer
Apanhei porque novamente chorei
Medo de rir
Medo de falar
Medo de brincar
Apanhava todo dia
Porque não me desenvolvia
Vizinhas, avós e tia
Pouco de mim fazia
A primeira surra (?)
Que não foi do meu pai
E nem da minha mãe
Do meu avô
Da babá e da minha tia
Era de um garoto da escola
Que de porrada me cobria
Minha mãe se drogava
Meu pai bebia
Meus irmãos brincavam
Enquanto de casa fugia
Muitos caminhões eu carreguei
Banheiros eu limpei
E em todos os dias que passei
Os livros não larguei
Estudei, me formei
Me viram
Os avisaram
Eu fui encontrado
Apareceram
Pai, irmãos, passarinho e gato
Na minha casa esmurrando a porta
Gritando em brado
Os ignorei
Apenas os animais entrar deixei
Prometeram voltar
Para de mim se vingar
Vingar o quê?
Na casa, no lar...
Se tudo que fiz foi chorar
E deles apanhar
Me mudei
Parti
Eles novamente nunca mais vi
A paz reencontrei
Neste sítio aqui
A lâmpada fui trocar
A cadeira cedeu
A minha cabeça
Na mesa bateu
Meu corpo no chão esmoreceu
Puta... que... pariu...
Tantas desventuras
Tantas lutas
E ser derrotado por um assento
quebrado.
O passarinho foge pela janela
Escuto seu cantar
(Minha morte a comemorar?)
O gato me cheira
Me lambe
Morde-me e se entorpece com meu
sangue
Traidores que eu adotei
Abracei
Amei
Da casa dos horrores tirei
Ledo engano
Família é sempre família
De sangue, amizade, folia
A ruindade é genética
Contagiosa
Espiritual
Podemos atrasar, enganar contornar
Evitar, fugir
Quando a mal em nós habita
Um dia ele florescerá
Nos encontrará
Ainda mais quando é herança de
família...
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