EXU

O BONZINHO

 



Eu escreverei aqui as minhas vivências e testemunho dos tempos em que frequentei templos de religião afro-brasileira. Como devota e cliente, porém, nunca como filha de alguém. Por graças, eu nunca quis, e foi uma das poucas decisões acertadas na minha vida.

Falarei de um dos exus mais controversos que conheci. As Marias Molambos. Uma delas nem falava mais comigo, quando me recusei a fazer um trabalho receitado por ela.

 

Molambo das Setes Encruzilhadas eu conheci em duas cabeças. Nas duas ela fez estragos.

Em uma delas escravizou o seu “cavalo”, embora Tia Maura jamais tenha se rendido às suas vontades. Mesmo com a Molambo a jogando nua na lama e na rua. Mesmo com a Molambo fazendo-a desaparecer e ser achada entre mendigos. Tia Maura quando queria um pouco de paz, de vez em quando cedia e fazia as vontades da sua pombagira e logo abandonava.

Tia Maura morreu seca, cega e travada na cama, sendo que antes disso tudo acontecer, a pombagira avisou do seu destino cruel pela última vez.

Apesar de tudo, considero minha tia uma campeã. Morreu, mas não cedeu aos caprichos de um ser demoníaco que reivindicava tanto, mas ofereceu nada pra minha tia. Que sempre viveu na miséria e na necessidade.

 

Essa mesma dita cuja virava na cabeça de Rosa.

Rosa andou tendo uns sonhos com suas pombagiras.

Em um deles, Molambo aos gritos dizia para ela não assentá-la, se fosse fazer, que assentasse a otária, a segunda pombagira presente, que fumava e bebia sua sidra indiferente aos ataques da Molambo. Pela descrição da Rosa, a pombagira quieta era a Maria Padilha.

Não seu quais outros sonhos que Rosa teve, como de costume, procurou sua mãe de santo. D. Eulina.

Ela virou Rosa na Pombagira, e nem ela sabe o que aconteceu.

Poucos falaram para ela alguns momentos aqui e ali.

O que viram foi um ser selvagem, animalesco, movido a fúria. Bebeu uma garrafa de cachaça inteira, apesar de Eulina oferecer sidra e cerveja.

_Eu bebo cachaça!

Desvirada, Eulina marcou um assento para a pombagira de Rosa.

A partir daí, essa senhora tentou jogar Rosa de fora do trem, em outro momento jogou o seu cavalo no arame farpado, Fátima que se meteu na frente, mas a intenção da pombagira era rasgar a cara da Rosa.

Acho que Rosa era como eu. Gostava na macumba, mas não queria compromisso, até que começou a cair dura no chão dos barracões, nos toques que frequentava. No Rio conhecido como “bolar” ou “Bolonar”. Nunca é coisa boa. Ou é santo pedindo pra ser raspado, e se já é raspado, algo desagrada o orixá.

Iniciada na religião, praticamente de forma obrigada por Oxum, Rosa limitou-se a sua obrigação de um ano, e nunca mais alimentou seus guias.

Tá certo que D. Eulina não ajudava em nada.

Se normalmente uma feitura ou obrigação equivale em gastos, a uma festa de 15 anos ou casamento, essas coisas com D. Eulina custavam claramente uma viagem a Dubai, com todos os luxos possíveis.

Não estou exagerando. Ela era a mãe de santo com maior número de filhos pendentes nas obrigações.

 


O que quero dizer:

Exu não é bonzinho.

Exu é humano.

A natureza dessa entidade era comum nas religiões pagãs antes do cristianismo. No cristianismo não existe o deus “humano”, existe ou bem e o mal que é o diabo, que tem muito dos deuses humanos pagãos.

Exu, na minha concepção, é um cara que perambula entre o inferno e a terra, que por vícios terrenos de faz tudo.

Um operário das ambições, invejas, desejos mundanos dos seres humanos.

De cura à morte, o exu faz, basta pagá-lo para isso.

Infelizmente, dependendo da sensibilidade mediúnica de cada um, ele pode sim se aproveitar das fraquezas de seus cavalos e escravizá-los ao seu bel-prazer.

Assim é exu.

Deixe-o quieto, não mexa com ele.

 

 

 

BÔNUS

Maria carregava uma Molambo, embora de cada 99 manifestações, 101 era Maria, não Molambo.

Era uma pombagira que adorava falar merda de algum presente no momento. Isso é, maria usava sua Molambo para atacar, falar mentiras sobre seus desafetos.

 

Todo ano a Molambo do Roger promovia a sua festa. Maria presente, e em como todo toque, manifestou sua “pombagira”.

Como era de praxe, ela foi levada para um quartinho para ser vestida.

Quando saiu, a Molambo do Roger aproximou-se dela e logo se formou uma roda de gente em torno das duas, após reclamação da dona da festa,  levam a Molambo(?) de volta para o quartinho.

A Molambo dona da Festa e homenageada não queria exus maus vestidos presentes.

 


Esse toque foi um esculacho só.

Lembro de uma pombagira manifestada num pai de santo, que sempre que eu o via em algum toque, ele arrumava confusão com o santo de alguém presente no local.

Os ogãs tocando constrangidos, e todos os outros exus manifestados saíram de dentro do barracão.

Essa pombagira estava toda serelepe. Eu mesmo nunca vi uma entidade desse jeito.

Sambava com suas caras e bocas.

Estava de bustiê, um pano amarrado da cabeça, e uma saia vermelha que por baixo dela, havia tantas armações, que deixou a saia acima do joelho.

Sobrou pra coitada da hekede Magali, que se explicava:

_Ela que escolheu. Ela queria a roupa de Oxosse, eu que não deixei.

A opinião era unanime:

Quem dançava ali, era a pombagira “pai de santo cheio de cachaça no cool”, isso sim.

 

 

Quer saber mais desses meus tempos loucos?

 

 

 

 

 

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