A LENDA
Era mais um trabalho escolar do
Sidney. O tema era o folclore. Tínhamos que levar artesanato para escola e
participar de uma exposição.
A cada objeto um ponto.
A exposição aconteceria no turno da
manhã. Na quadra da escola.
Fiz e hora depois, subindo a
escadaria da escola, senti uma dor até então inédita na minha vida, na região
da barriga.
Comentei com a minha amiga Patricia,
que estava ao meu lado:
_Hum... Uma dor na barriga, agora.
Cheguei em casa, era tempo apenas
para tomar banho, almoçar vestir o uniforme e voltar para o CEM.
No banheiro, a surpresa no fundilho
da calcinha: Eu me tornei uma “moça” de fato.
Chamei pela minha mãe, minha tia veio
me atender. De primeiro duvidou e pediu para ver a calcinha, mostrei e saiu
cheia de nojo, arrependida do pedido.
Antigamente o absorvente era chamado de "Modess" por causa dessa marca. Era o rival do Sempre Livre. |
Fui a penúltima das primas a “me
formar”. Cristina, Solange, todas já eram moças, para o orgulho das suas
mães.
De certa forma, me orgulhei também.
Porém o pesadelo apenas começava...
Minha casa era um reduto de
testosterona. Pai, irmãos, tio e empregados.
Pedi para que minha mãe não
comentasse com ninguém o ocorrido. Afinal, menstruação também era tabu. Era vergonha,
quando não nojo.
A mulher menstruada era um segredo
somente dela.
A coroa não se conteve.
Assim que saí do banheiro, senti os
olhares tortos dos (muitos) homens da família.
Minha mãe morreu meses depois e tive
que aprender a lhe dar com o absorvente praticamente sozinha.
Entortava, manchava a calcinha, meu
mundo acabou quando um deles vazou.
E pior, saber que mentiram pra mim de
forma descarada.
Que dura entre 3 ou 4 dias no máximo.
Que era um sanguinho de nada, e a
minha era uma torneira jorrante, com direito a pedaços gigantes de sangue
pisado. O maior terror de todos: a cólica.
Eram cólicas de me jogar no chão e
rolar de dor. Além de durar exatos 10 dias.
Moças honradas não podia usar esse daí. Usei uma vez e me machucou toda por dentro. Prefiro o OB ou intimus |
Vendo meu histórico familiar materno,
minha tia e minha mãe possuía esses ciclos horrendos. Mesmo assim, insistiram
na mentira. Fora o fato de que torna-se “moça” era prêmio. Pra mim sempre foi
castigo...
Menstruei ou “monstruei” como gosto
de dizer num dia “especial”, no dia do folclore. Tudo a ver. Pois tudo que me
ensinaram sobre essa monstruosidade que é sangrar, era o mais puro folclore.
Era apenas mais uma entre tantas
outras mentiras deslavadas e descaradas que falam para nós, meninas, e caímos
direitinho.
Talvez eu escreva sobre as outras
mentiras que nos contam, que acreditamos até a idade adulta, e que aprendemos
da pior maneira o quanto fomos enganadas, uma delas é sobre virgindade e casamento.
Mas isso é tema para outro texto.
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