O MISTÉRIO DOS LIVROS PERDIDOS


Quando eu terminava de ler um livro, comprado ou achado no ferro-velho, o colocava na grande estante da sala.

Estante como aquela, é um móvel que não existe mais. Hoje é tudo rack.
Meus pais na sua ingenuidade, preencheram os espaços da instante com dicionários de capa dura, vários volumes, enciclopédicos.
Na escola sempre tínhamos a visita de vendedores de coleções.
A pedido do meu irmão, eles compram a Enciclopédia de Pesquisa Escolares. Um clássico nas casas.
Eu comprei o guia do estudante.
Também compraram pra mim, coleção de contos mundiais infantis, do sítio do pica-pau amarelo (esta mais ligada à série de TV, do que a obra original de Monteiro Lobato, e a minha preferida, da turma do Lambe Lambe do Daniel Azulay.
A última foi a enciclopédia Barsa, que me ajudou bastante nas minhas pesquisas escolares, em tempos da não existência da internet.

Esses livros eram intocáveis.
Já os que lia e colocava na estante tinham o cruel destino: o desaparecimento, acredito eu, o lixo.
Quem jogava fora os livros que lia?
Eu colocava lá, porque lá era o local deles.
O que se passava na cabeça de alguém, para jogar os livros fora?
Não acredito que eram meus pais.
Eram simples, humildes, mas nunca me negaram qualquer incentivo à leitura.
Sabia que as chances de algum outro membro da minha família lê-los eram perto de zero, mesmo com tudo contra, sempre acreditei que livros devem ser repassados e não trancados.
Claro, tem os especiais que ninguém empresta e ninguém dá.
Eles ficavam na minha casa, na sala, e desapareciam para nunca mais vê-los.
Duvido que tenham sido emprestados ou dados.

Tenho quase a certeza de quem fez isso foi o meu irmão, o sociopata que veio parar no nosso ninho.
Numa família em que nunca fui respeitada ou levada a sério, a minha situação com esse infeliz era ainda pior.
A verdadeira missão desse doente sempre foi me anular como ser humano.
E conseguiu.
Sabe o que é acreditar que tem um amigo e descobrir que ele nunca te ouviu, nunca te levou a sério, porque esse irmão, sempre “avisava” as pessoas ao meu redor, que eu era maluca?


Então para ele, era mais que razoável destruir qualquer personalidade minha na casa.
Uma vez ele tirou da parede os desenhos que havia feito.
Minha mãe até brigou com ele.

Quem pagou o pato foram os livros.

Não Engulo Até Hoje:
Foi parar no ferro-velho A Divina Comédia, de Dante com capa dura vermelha, título em letras douradas e ainda por cima ilustrada.
Quem achou foi o meu irmão Alex, acho que foi o único livro que ele leu até hoje.
Implorei para ele me emprestar, mas ele deu preferência a vizinha.
Nunca mais vi o livro, e ele, que não teve pudores nenhum em dá preferência à vizinha, mesmo sabendo da minha sede em ler o livro, ficou “sem graça” de pedir o livro de volta. E ela nunca teve a honestidade de devolver depois de lido.
Revoltante, não?

De toda minha família, acho que a única que gosta de ler, é a minha sobrinha Larissa.
Ele já deve ter lido mais livros que eu.
Vou ver o que posso fazer pelos meus sobrinhos caçulas, para que eles virem leitores. Não apenas soletradores de sílabas, como a maioria esmagadora desse país. Mesmo aqueles com diplomas universitários, não costumam escapar da maldição da educação brasileira e do baixo interesse dos pais em despertar a leitura nas suas crianças.

Mães e pais que sentem o maior orgulho de verem seus filhos cantando música pornográficas e machistas e filhas antes dos 3 anos, simulando atos sexuais numa coreografia do funk.


Literatura Infanto-Juvenil 3 por 1 Real

Nega Thereza apareceu com um monte de livros em meio aos papelões para me vender.
Os separei e resolvi vendê-los numa banquinha  improvisada fora do ferro-velho.
Em 15 dias de exposição, só vendi nove.
Tinha adulto que só queria um e vinha me pedir desconto, como dizia que o preço era o mesmo, ele não comprava.
Compradores?
Duas mães.
Uma comprou seis (dois reais) e a outra três (um real).
A venda foi frustrante, porém...
Eu vi uma menininha com menos de cinco anos, deitada sobre a banca, em plena felicidade, abraçando os livros, querendo lavar todos, me comove até hoje.
Então, digo:
Valeu muito à pena.
 Valeu demais.






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